O trabalho de Harry Seidler e suas influências, por Wilson Barbosa Neto e Vladimir Belogolovsky

Por Wilson Barbosa Neto e Vladimir Belogolovsky

Edição 242 - Maio/2014

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Harry Seidler foi o primeiro arquiteto a expressar plenamente os princípios da Bauhaus na Austrália, exemplificado em seu primeiro projeto construído (1950), a Casa Rosa Seidler em Wahroonga, ao norte de Sydney, para seus pais. Em toda sua vida, ele foi, em suas próprias palavras, "vanguardista da arquitetura moderna", um missionário de coração pela causa modernista.

Nativo de Viena, Harry Seidler foi o segundo filho da família judia de classe média alta de Max Seidler, empresário do ramo têxtil, e de Rose Seidler, que veio de uma família grande, donos de uma carpintaria. Em 1938, com 15 anos, Harry foi à Inglaterra logo após os nazistas alemães invadirem a Áustria. Em maio de 1940, foi preso pelas autoridades britânicas como um inimigo estrangeiro, levado à Ilha dos Homens, depois, a um campo de detenção em Quebec, no Canadá. Em outubro de 1941, foi solto e colocado em liberdade condicional para estudar arquitetura na Universidade de Manitoba, em Winnipeg.

Seidler recebeu seu diploma de mestrado na Escola de Design de Harvard, onde teve uma bolsa de estudos entre 1945 e 1946 ao lado de Walter Gropius e Marcel Breuer, mentor por toda a vida e amigo. Depois, foi para a faculdade de Black Mountain, na Carolina do Norte, onde estudou com o pintor Josef Albers e, em seguida, trabalhou como primeiro assistente de Breuer em Nova York. Em 1948, foi convidado por sua mãe para ir à Austrália, país para o qual seus pais imigraram depois da guerra, para projetar uma casa para eles. A caminho da Austrália, parou no Brasil: Seidler trabalhou no escritório de Oscar Niemeyer no Rio de Janeiro por alguns meses. Seu entusiasmo pela nova arquitetura encontrada no Brasil o aproximou do trabalho desenvolvido pelo arquiteto brasileiro ao longo de sua carreira. Segundo Seidler, as formas exuberantes e esculturais dos edifícios brasileiros eram novidades. Ele ainda relatou que as estruturas dos edifícios eram de concreto armado, muito diferente dos sistemas construtivos de madeira leve utilizados nos Estados Unidos.

Em setembro de 1948, Seidler abriu um escritório em Sydney. O ambicioso homem de 25 anos, em seu pequeno estúdio/apartamento, fez uma declaração proeminente: "Os escritórios australianos de construção atuais estão obsoletos. Eles imploram por renovação. Vai ser a política desse escritório criar padrões que produzirão uma arquitetura contemporânea progressista". A carreira produtiva de quase 60 anos do arquiteto o provaram certo. Aproximadamente 160 de seus projetos - desde uma pequena casa de família a prédios de apartamentos, torres de escritórios até centros cívicos e culturais, assim como importantes construções governamentais - foram realizadas na Austrália, Áustria, França, Israel, Itália, México e Hong Kong.

O inconfundível conjunto de obras de Seidler, marcado pela forte percepção geométrica, original do barroco, cercada pelo sentimento robusto do equilíbrio das composições, o conhecimento de estrutura e dos materiais, além do uso inventivo de elementos de sombreamento que efetivamente atuavam sobre o intenso sol australiano, distinguiu-o como sendo o arquiteto mais intransigente e artístico no seu país adotivo e um dos mais perseverantes e engenhosos arquitetos do seu tempo. Sua arquitetura abraçava fontes e influências que foram estrategicamente absorvidas e refinadas ao longo da sua carreira - confiança, preocupação social, abordagem metodológica e colaborativa do projeto de Gropius, tipologias residenciais, a força do concreto, o calor da madeira herdada de Breuer, sistemas construtivos padronizados e uma linguagem estrutural de Pier Luigi Nervi, fluidez escultural e formas líricas de Niemeyer, o profundo conhecimento de como os nossos olhos reagem ao fenômeno visual aprendidos de Albers.

"(...) Tenho Harry Seidler como um amigo querido. É com muita saudade que recordo os primeiros tempos em que nos conhecemos no Rio de Janeiro, nos anos de 1940, todos nós movidos pelo entusiasmo pela arquitetura moderna. Recepcionei-o, se é possível falar, em meu escritório, onde trocávamos ideias em torno da aliança entre três elementos básicos que caracteriza o modernismo arquitetural: o uso social, o recurso à tecnologia mais avançada e a busca da liberdade plástica. Harry revelou desde cedo uma sólida formação e acompanhava com o mais vivo interesse o desenvolvimento dos meus projetos (...)"
Oscar Niemeyer, junho de 2012

A partir de 1970, as mãos de Seidler foram cada vez mais influenciadas pelos trabalhos modulados de pintores e escultores abstratos e expressionistas norte-americanos, evoluindo para uma linguagem artística pessoal distinta que ainda está para ser reconhecida internacionalmente. O trabalho mais recente de Seidler, embora livre e escultural, nunca é arbitrário. Suas majestosas formas geométricas foram perpetuamente definidas por um planejamento racional, pela eficiência da padronização construtiva e por aspectos sociais e ambientais.

CASAS EM SYDNEY
Harry Seidler se preocupou em fazer projetos de casas por toda sua carreira. A maioria desses projetos foi construída ao redor de Sydney, e foi realizada em vários momentos de sua carreira, desde o começo dos anos de 1950 até o final dos anos de 1990.

Destacam-se a casa de Rose Seidler, a casa de Julian Rose e a casa de Marcus Seidler - todas construídas na década de 1950 para a família de Seidler, imediatamente após a chegada do arquiteto na Austrália. Todas as casas com uma curta distância entre elas foram magistralmente encaixadas em um terreno inclinado de mata nativa em Wahroonga. Apresentaram princípios da Bauhaus e princípios modernistas que o arquiteto aprendeu em primeira mão nos Estados Unidos, quando era estudante de Walter Gropius e Marcel Breuer em Harvard, e como aprendiz do Breuer em Nova York. Essas estruturas celebram a vida moderna e, assim como todos os projetos subsequentes de Seidler, são meticulosamente detalhadas e executadas.

A própria casa do arquiteto em Killara, projetada com a colaboração de Penelope, sua esposa, também arquiteta, foi construída em um declive acidentado em 1967. Foi uma oportunidade para ir além nos experimentos com concreto armado - e que contrastou com suas casas anteriores de madeira e estrutura de aço.

A Casa Berman (1999), construída em um vale em Joadja, confirmou a evolução contínua da linguagem arquitetônica do arquiteto. A casa atesta um equilíbrio requintado entre os planos geométricos binucleares e os telhados em formato de onda, manifestando a inspiração de Seidler, enraizada igualmente nos princípios de planejamento de Breuer e no uso experimental de materiais e formas contrastantes. Além disso, é evidente a influência dos planos e das superfícies fluidas de Francesco Borromini, e dos elegantes contornos curvos de Oscar Niemeyer.

TORRES EM SYDNEY
As torres projetadas por Harry Seidler imprimem silhuetas distintas sobre o horizonte da cidade. Dentre os edifícios, incluem-se o icônico Australia Square (1967), primeiro arranha-céu australiano genuíno e um espaço público popular; o MLC Center (1975) com 60 andares, que foi a mais alta torre de concreto armado do mundo quando concluída; o Capita Centre (1984), em que Seidler corajosamente experimentou jardins verticais e, de maneira criativa, transformou um terreno apertado e de difícil implantação em uma praça cívica e em um edifício digno; o Grosvenor Place (1988), um grande movimento curvo, efetivamente visível a partir do porto e adornado com uma varredura variável de brises fixos inclinados feitos de alumínio, respondendo ao caminho diário do sol; e o enfático Horizon Apartments (1998), com as suas linhas onduladas elegantes de varandas alternadas.

Além de transmitir fortes declarações sobre o horizonte de Sydney, essas torres contribuem positivamente à nivelação urbana, oferecendo espaços abertos necessários para o público apreciar a natureza diversificada e envolvente da vida urbana. Cada edifício consegue isso a sua própria maneira, aproveitando as condições do local e a geometria buscada pelo arquiteto. Estes edifícios, que são referências, exibem orgulhosamente seus traços esculturais, expondo os princípios em que foram erguidos. Respondem ao intenso sol local com proporções bem dimensionadas das superfícies sólidas e envidraçadas e do uso de dispositivos de proteção solar que, juntamente com as suas sombras dinâmicas, pintam impressões memoráveis como descrito por Seidler: "A luz solar é o elemento mais poderoso de design da arquitetura".

BIBLIOGRAFIA
BELOGOLOVSKY, Vladimir. Harry Seidler Lifework. Rizzoli International Publications, 2014. Exposição Itinerante. Harry Seidler. Arquitetura, arte e design colaborativo. Intercontinental Curatorial Project, Nova York, 2012/2014.

WILSON BARBOSA NETO é arquiteto formado pela Faculdade Univix, em Vitória. Entre 2009 e 2010 trabalhou no escritório de arquitetura Harry Seidler & Associates, em Sydney, onde participou dos projetos de revitalização dos edifícios MLC Centre e 9 Castlereagh Street, em Sydney, Riverside Centre e Riparian Plaza, em Brisbane. Em 2013, obteve o título de mestre em arquitetura, tecnologia e cidade na Unicamp. É professor da Faal, em Limeira, SP, e cocurador da exposição itinerante sobre e obra do arquiteto Harry Seidler no Brasil.

VLADIMIR BELOGOLOVSKY é arquiteto e fundador da intercontinental Curatorial Project com sede em Nova York. Dentre suas publicações estão Green House (Tatlin, 2009), Modernismo Soviético 1955-1985 (Tatlin, 2010) e Harry Seidler: Lifework (Rizzoli, 2014)

AGRADECIMENTOS
À Embaixada da Austrália em Brasília e ao Departamento de Língua Estrangeira e Tradução (UnB) pelo auxílio na tradução dos textos da exposição para a Língua Portuguesa

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Fonte: http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/242/o-trabalho-de-harry-seidler-e-suas-influencias-por-wilson-311274-1.aspx

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