De fundador da FAU a Professor Emérito, o construtor da UnB: Lelé

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Por Cláudio Queiroz

Lelé nasceu em 1932, no Rio de Janeiro, no Encantado, subúrbio da Central, mas ganhou o apelido nas peladas da Ilha do Governador. Na década de 1940 havia um craque, meia direita vascaíno, com esse cognome. O futuro arquiteto jogava na mesma posição, daí o apelido.
“(…) Assim, no âmbito da nossa arquitetura onde são tantos os valores autônomos com vida própria, ele e o Oscar se completam. Oscar Ribeiro de Almeida Niemeyer Soares, arquiteto artista: domínio da plástica, dos espaços e dos vôos estruturais, sem esquecer o gesto singelo, – o criador. João da Gama Filgueiras Lima, o arquiteto onde arte e tecnologia se encontram e se entrosam, – o construtor.
E eu, Lucio Marçal Ferreira Ribeiro de Lima e Costa – tendo um pouco de uma coisa e de outra, sinto-me bem no convívio de ambos, de modo que formamos, cada qual para o seu lado, uma boa trinca: é que sou, apesar de tudo, o vínculo com o nosso passado, o lastro, – a tradição.” (Costa, L., 1995, p.434).(Grifo nosso)
Lelé iniciou em 1951 seus estudos de arquitetura na Escola de Belas Artes onde se formou em 1955. Referia-se à escolha profissional, como uma casualidade: acidental. Aos dezoito anos era escrevente-datilógrafo da Marinha. Habilidoso ao desenhar, foi aconselhado por colega de trabalho a estudar arquitetura, profissão que desconhecia a essência, embora fosse informado da semelhança com a engenharia.
Egresso da Escola Militar, tinha bons conhecimentos em matemática, além de destreza inata em desenho, mas contou com a sorte para superar sua relativa proximidade com as Belas Artes.
Filho único, foi arrimo da família humilde ao perder cedo seu pai. O jovem estudante de arquitetura já ganhava desenhando perspectivas; e à época, aos sábados tocava acordeão em bailes de boates, músico afinado que era também em flauta e piano.
Em 1957 veio para Brasília construir Superquadras do Instituto de Aposentadoria dos Bancários (IAPB); em 1960 casou-se com Alda Rabello Cunha e em 1962, chamado por Oscar Niemeyer, veio para a Universidade de Brasília (UnB). Sob a orientação do mestre, viveu o desenvolvimento da pré-moldagem pioneira nos edifícios de Serviços Gerais (SG) e do Instituto Central de Ciências.
Este, inacabado até hoje, como consequência da exoneração de Niemeyer e dele próprio, entre o número grande de professores; muitos do Instituto Central de Artes/Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (ICA/FAU). Do Lelé, propriamente, ficaram as obras primas de 1962: os SGs altos e os blocos residenciais da Colina (pilotis + 3); em 1996 Lelé concebeu a Fundação Darcy Ribeiro, o Beijódromo.
“Gosto de falar dos amigos e, quando se trata de um velho e querido companheiro como Lelé, mais ainda. Lembro-me com saudade, daqueles tempos em que na Nova Capital juntos vivemos, do trabalho a nos ocupar dia e noite, e nós a resistir a solidão implacável, rindo, abraçados como se a vida fosse apenas um passeio ”. (…)
Oscar, na ocasião do depoimento, em 1999, se refere à Lelé como o grande mestre da arquitetura, a partir de Brasília e do país, acentuando seu conhecimento exponencial como artista construtor, um arquiteto em plenitude:
(…) “Recordo-me de uma conversa que tive no Instituto dos Arquitetos do Rio de Janeiro, e de como não me contive quando o assunto de hospitais foi abordado: Hoje, quem quiser projetar um hospital atualizado, tem, antes, de conversar com Lelé”. (…)
Mas Lelé, ele mesmo considera que quando se concebe o espaço como um especialista, a obra começa a prejudicar-se pela ausência do próprio arquiteto, o responsável pela função humana primordial.
Assim, declarando seu aprendizado fundamental sobre o espaço, com o Oscar, não descartava a admiração inspiradora percebida nas construções de Corbu, Mies, Frank Lloyd, Aalto e Neutra.
Da mesma forma, ele estudava a arquitetura gótica, a japonesa e a nórdica, se admirando da árabe e de sua totalidade arquitetural, feita de sombra, luz, ventilação natural, domínio dos ventos e integração das artes. Ao mesmo tempo se rendia à essencialidade da construção típica do Xingu, com suas varas estruturais protendidas e harmonia natural, adequadas.
Além de Vitrúvio, que ao seu tempo tinha plena consciência dos elementos naturais a condicionar o gesto arquitetônico, Lelé nos anos 1960 surpreendia muitos pelo zelo com a vegetação preexistente, com uma arbustiva no lugar, ou com uma árvore presente no terreno do projeto.
De suas obras sociais construídas às residências funcionais de Brasília; das pequenas escolas rurais às moradas simples de seus amigos em Abadiânia, dentre elas a de Frei Mateus, vice-reitor na UnB de Darcy; são todas emblemáticas, à luz dos bens do espírito, da racionalidade funcional desse artista construtor tratado pelo apelido: Lelé, o “Seu” Lelé, ou o Dr. Lelé.
Passada a existência do último herói da referida tríade assumida por Lucio, ficam as reflexões para a posteridade sobre as derradeiras concepções do arquiteto Lelé; sobre a maneira como a sociedade despreza as contribuições intelectuais e científicas; como as dele, para o país que tanto amou.
A título de exemplo, sua proposta ao governo, para atenuar a deficiência habitacional, entre outras tantas.

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                                                                                                                                                               Cláudio José Pinheiro Villar de Queiroz é professor do Departamento de Projeto, Expressão e Representação em Arquitetura e Urbanismo, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da UnB. Graduado em Arquitetura pela Fundação Educacional Rosemar Pimentel, mestre em Arquitetura e Urbanismo e doutor em Desenvolvimento Sustentável pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável, ambos pela UnB. É especialista em Conforto Ambiental pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil e em Desenho Urbano/UnB. Atua nos temas: Urbanismo, Arquitetura, Brasília, Planejamento Urbano, Bacia do Paranoá.

Via : CAU/BR

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